Muito se Fala da China. Mas o Que é Verdade?
- Ana Maria G
- 13 de jul.
- 4 min de leitura

A posição da China no mundo contemporâneo desafia rótulos e previsões. Enquanto muitos países valorizam a democracia multipartidária como pré-requisito para o progresso, a China provou que é possível crescer e inovar sob um sistema de partido único, comandado pelo Partido Comunista Chinês (PCC). Essa realidade provoca admiração, dúvidas e até medo no Ocidente. Mas, para além dos estereótipos, que lições a China pode oferecer ao Brasil e ao mundo? Este artigo busca esclarecer, com dados e análises, como funciona o modelo econômico chinês, sua governança política e a relação pragmática que temos com essa potência global.
A cultura confuciana(Confúcio), molda profundamente a visão chinesa de governança, valorizando a meritocracia, o papel ético dos governantes e a harmonia social. Desde a antiguidade, Confúcio enfatizou que líderes devem governar pelo exemplo moral e competência, ideia que permeia até hoje a estrutura política chinesa. Essa tradição justifica a seleção de líderes com base no mérito e na capacidade de servir ao bem comum, não apenas pelo poder ou nascimento.
Esse diálogo entre tradição e modernidade explica a singularidade do modelo político chinês, onde a meritocracia confuciana encontra nova expressão na administração centralizada e no fortalecimento institucional do PCC.
O Modelo Econômico Chinês: Nem Capitalista, Nem Socialista Puro
Desde as reformas iniciadas por Deng Xiaoping nos anos 1980, a China adotou o que chama de “socialismo com características chinesas”. Na prática, isso significa:
Uma economia mista: o Estado ainda controla setores estratégicos (energia, transporte, finanças), mas há amplo espaço para empresas privadas, mercado e inovação.
A presença de zonas econômicas especiais, onde investimentos estrangeiros são incentivados.
Forte planejamento estatal com metas de longo prazo, como o plano “Made in China 2025”, focado em alta tecnologia.
Resultado: crescimento médio acima de 6% ao ano por décadas, retirada de 800 milhões de pessoas da pobreza e transformação em potência tecnológica.
"A economia chinesa cresceu de forma consistente nas últimas quatro décadas. Segundo o Banco Mundial, o país saiu de cerca de US$ 0,3 trilhão em 1980 para mais de US$ 18 trilhões em 2024."
Partido Comunista Chinês: Como Funciona?
Ao contrário do que muitos pensam, o Partido Comunista Chinês não é um monolito fechado e atrasado. O partido investe pesado na formação técnica e administrativa de seus quadros, com critérios meritocráticos para progressão interna. Isso cria uma governança altamente profissionalizada e focada em metas de longo prazo.Ele opera como uma grande máquina de gestão nacional:
Quadros altamente treinados: muitos dirigentes do PCC passam por formações técnicas e administrativas exigentes.
Meritocracia interna: cargos importantes são, em muitos casos, conquistados por desempenho, não apenas por ideologia.
Planejamento estratégico: o partido comanda planos de 5, 10 e até 50 anos, algo raro em democracias onde governos mudam a cada 4 anos.
É verdade que não há eleições multipartidárias como no Ocidente, mas também é verdade que há formas de consulta popular, inclusive digitais, e uma preocupação crescente com respostas às demandas sociais.
Um Partido, Muitos Caminhos: Controle, Mas Não Imobilismo
O PCC (Partido Comunista Chinês),mantém o controle do poder, mas permite liberdade econômica, crescimento da classe média e consumo privado em larga escala. A repressão política existe, especialmente a movimentos que desafiem a unidade nacional, mas há espaço para debate interno e até autocrítica institucional ,algo impensável em regimes totalitários do século XX.Embora o PCC mantenha controle político rígido, o espaço para a liberdade econômica é notável. A classe média chinesa já ultrapassa 400 milhões de pessoas, com consumo privado crescente e diversificação da economia para serviços e tecnologia.
Dados: Centro de estudos de política global que apresenta análises detalhadas sobre a classe média chinesa.
Composição da economia chinesa:
A composição do Produto Interno Bruto (PIB) da China revela a dinâmica econômica do país. Cerca de 60% do PIB é gerado pelo setor privado doméstico, que impulsiona a inovação e o consumo interno. As empresas estatais respondem por aproximadamente 30% do PIB, mantendo o controle estratégico em setores chave como energia, telecomunicações e infraestrutura. O investimento estrangeiro contribui com cerca de 10%, refletindo a abertura gradual da economia chinesa e sua integração no mercado global.
"Segundo o National Bureau of Statistics of China (2023) e análises do Banco Mundial, aproximadamente 60% do PIB chinês é gerado pelo setor privado doméstico, cerca de 30% pelas empresas estatais e 10% pelo investimento estrangeiro direto."

Brasil e China: Uma Parceria Estratégica e Pragmática
A China não exige alinhamento ideológico, apenas estabilidade jurídica e respeito a contratos.
O Brasil é o maior parceiro comercial da China na América Latina. Em 2023, nossas exportações para aquele país ultrapassaram US$ 100 bilhões, especialmente em commodities como soja, minério de ferro, petróleo e carne.
Mas a relação vai além do comércio. A China tem investido em infraestrutura, tecnologia e energia no Brasil, sem impor alinhamentos ideológicos, o que abre espaço para cooperação pragmática, baseada em estabilidade jurídica e respeito a contratos.
O modelo chinês não é perfeito e enfrenta desafios internos significativos: envelhecimento populacional, desigualdades regionais, tensões geopolíticas e riscos ambientais. Entretanto, sua capacidade de adaptação, planejamento e inovação é um exemplo para democracias como a nossa.
O Brasil, como país democrático, não precisa copiar o modelo chinês, mas deve compreendê-lo profundamente para dialogar e tirar proveito das oportunidades, evitando o preconceito e a desinformação.
Conhecimento e Diálogo Para um Futuro Melhor
A China é um sistema híbrido, que desafia classificações simples de democracia ou ditadura. Seu crescimento econômico e inovação tecnológica mostram que existe mais de um caminho para o desenvolvimento.
Para o Brasil, entender a China é essencial - não para concordar ou discordar, mas para preparar estratégias econômicas, políticas e culturais que fortaleçam nossa posição no mundo globalizado.
Por Ana Maria Galbier — Cientista Política | Global Olhar







Comentários